sábado, 16 de abril de 2011

"Operação Açores"


OPERAÇÃO AÇORES

Viajar é um vício que tenho entranhado no corpo e, sempre que posso (e as finanças o permitem), não perco a oportunidade de ir além do horizonte de todos os dias, procurar o mundo alternativo que por vezes nos falta e confrontar o imaginário, abstracto e enigmático, com o real. Nascemos num lugar, mas acabamos sempre por fazer um desvio no roteiro da vida, para nos encontrarmos com outros lugares. E nada melhor que o fascínio “insaciável” dos Açores para se conseguir esse intento.
Estaria tudo bem naquele Verão de 2001 (a minha esposa partilha comigo tudo o que seja viajar e o seu espírito de aventura nunca se esgota), se não fossemos confrontados com um problema habitual nestas andanças: hotéis superlotados. O mês de Agosto é o mais problemático para quem quer desvendar a tela multicolor daquele místico arquipélago e, por mais esforços que fizéssemos, não conseguimos o tão ambicionado alojamento.
Já tínhamos as passagens de avião marcadas e sentimos, como é óbvio, uma pesada sensação de desânimo. Mas não desistimos. Passado que foi o amargo de boca, assolou-nos a vertigem própria de um contratempo estúpido, que teve o condão de nos aguçar ainda mais o apetite e nos fez tomar a única decisão possível. Um olhar cúmplice foi quanto bastou: a tenda de campismo cumpriria, mais uma vez, a sua missão. Açores... aí vamos!
A ilha Terceira foi a primeira a acolher-nos, desejosa de que desvendássemos a sua riqueza histórica e visual. Alugámos um carro no aeroporto e iniciámos ali o circuito, deixando-nos conduzir por paisagens avassaladoras, longe da modernidade urbana, totalmente entregues à força agreste da natureza. Chegou a noite e antes de nos submetermos à “luta pela sobrevivência”, procurando um parque de campismo (em último recurso, qualquer refúgio escondido no monte serviria para montarmos a tenda) demos uma volta pelas redondezas de Angra do Heroísmo e, ao fim de muito esforço, conseguimos desencantar um quarto numa casa particular, onde acordei para o primeiro dia dos meus cinquenta e um anos.
Angra, jóia preciosa, cujo centro histórico é classificado pela Unesco Património da Humanidade, foi o passo seguinte. A marca indelével que a vida militar deixou em mim, puxou-me de imediato para a imponente fortificação de São João Batista, no Monte Brasil, um exemplar único de arquitectura militar luso-espanhola que, indiferente aos séculos, é testemunha de um passado recheado de histórias fantásticas. Ali estiveram figuras célebres, como D. Afonso VI e Gungunhana. Actualmente, aloja o Regimento de Guarnição nº 1.
Pedimos a autorização para a visita e iniciamos a ronda cultural, orientados por um militar especialmente destacado para o efeito. Poucos passos tínhamos dado, quando nos cruzamos com um oficial de patente superior, que ostentava o tão familiar símbolo de “Comando”. Houve de imediato uma voz interior que me interrogou: “Estás à espera de quê para te apresentares?”. Como sabem, os nossos códigos de amizade transcendem e não se confundem com relações fúteis e efémeras. São consolidados por ideais que se regem pela mesma causa, pelas mesmas vivências, que nos abrem caminhos em qualquer local do planeta. Senti o apelo do “Crachá” e, quase instintivamente, aproximei-me do oficial. Ele parou, olhou-me com alguma curiosidade e, parecendo ter adivinhado as minhas intenções, deixou que me apresentasse. Não demorou muito até encetarmos um diálogo espontâneo, aberto, como se fossemos amigos de sempre.
A história ficaria, porventura, por aqui, se não houvesse a tal força, os tais códigos de amizade que nos unem. A convite do camarada (garanto-vos que não foi apenas um mero gesto de cortesia, conforme vereis a seguir), acabei, juntamente com a minha esposa, a saborear uns aperitivos no bar, em são convívio com outros militares, alguns deles também Comandos. Conversa puxa conversa, onde estiveste, a minha Companhia foi a tal e tal, por onde tens andado agora, o que fazes, projectos para a vossa estadia nos Açores, por aí fora… enfim, conversas de ocasião, que vão dar, inevitavelmente, àquilo que todos imaginam… O passado militar de um Comando é como um jogo de caixinhas chinesas, que saem sucessivamente umas de dentro das outras! Dos aperitivos passou-se ao almoço, com um brinde especial ao meu aniversário; do almoço ao café e, – pasme-se –: antes da retirada do pessoal para os respectivos locais de trabalho, alguns telefonemas, feitos em tempo recorde, o tempo que leva a tomar um digestivo, resolveram-nos, como por magia, o problema do alojamento nas restantes ilhas (São Miguel, Pico e Faial).
Sei que estas atitudes de boa camaradagem entre militares, sobretudo entre Comandos, são espontâneas e dispensam encómios, contudo, queria deixar aqui mais um grande abraço de reconhecimento ao camarada que nos ajudou. Graças à sua disponibilidade desinteressada, aliada, naturalmente, à sua posição hierárquica e às boas relações com os seus pares, a tenda não chegou a sair da mala. Tivemos tratamento VIP em todas as ilhas visitadas, cumprindo-se assim com êxito total a “Operação Açores”. Por outro lado, como devem calcular, foi-me proporcionado um almoço de aniversário inesperado e invulgar, que jamais esquecerei…!



Alexandre Marta

Nota : mais um artigo do nosso amigo e camarada alf. Monteiro (desculpa para mim serás sempre alf. Monteiro apezar da tua patente ser muito superior )extraido do boletim da associação de comandos de Almada.

1 comentário:

  1. Obrigado camarada pela tua preciosa colaboração, em não deixares adormecer este NOSSO blog, pertencente a todos quantos pertenceram á gloriosa 33ª companhia de Comandos.

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